sábado, janeiro 31, 2004

E para não fugir a regra, senti uma certa obrigação de escrever sobre Dogville. E acho que não se dá pra escapar mesmo disso, porque o filme deve ser discutido, uma discussão que vá além de dizer que Von Trier é isso ou aquilo (mestre, agitador, picareta, arrogante, inovador), que o filme é uma obra-prima, ou mais um embuste criado pelo hype. Nesse sentido fui procurar mais informações, depois de ver o filme, para poder escrever sobre ele. Pois bem, quase tudo o que eu tive vontade de apontar, as coisas que me chamaram atenção no filme estão mais ou menos explicada em um texto do próprio Von Trier no site oficial do filme. Então, já que está tudo lá, devo escrever outra coisa.

O fato de o próprio Von Trier dizer que o filme surgiu, entre outros motivos, por causa das críticas que recebeu, na época de Dançando no Escuro, por fazer um filme sobre os Estados Unidos sem nunca ter estado lá, chama atenção para um aspecto: o filme foi desenvolvido não em cima de uma “experiência imediata” e sim sobre o imaginário e as representações do que vem a ser os Estados Unidos. A possibilidade de trabalhar em cima de músicas e fotografias (como é feito neste filme) para se criar uma visão própria sobre a sociedade americana. Toqueville precisou viajar pelos EUA para escrever suas impressões, Von Trier, não. Em Elogio ao amor, de Goddard, acusa-se os americanos de se apropriar das histórias dos outros para criarem mitos (a crítica maior de Goddard é com relação ao holocausto), pois eles mesmos não teriam uma história. Parece-me que Von Trier fez exatamente o contrário ao se apoderar de um momento histórico como a grande depressão. Estaria o cinema europeu está partindo para o contra-ataque?

Nunca fui para os Estados Unidos, nunca estudei a fundo sobre a depressão. O que sei sobre essa sociedade vi, a maior parte, nos filmes. Mas posso dizer que Von Trier fez um bom trabalho, mesmo que tenha sido para mostrar suas próprias fantasias.