domingo, março 27, 2005

a gravidade das coisas

então eu era esse cara que vivia preocupado com tudo. nada me parecia bem. as coisas a minha volta só serviam para me causar preocupações. mesmo quando tudo parecia ir bem, era um motivo para pensar. "como assim está bem?" "quem pode dizer quando as coisas estão bem?" motivo para sorrir e cantar? sim, alguns. e sorria e cantava. mas, e depois? tinha aquela casa que nunca estava arrumada. aquela pessoa que nunca ligava. o trabalho que não valia de nada. o dinheiro logo acabava. e pensar no futuro? eu percebia que tinha tanta coisa mas no final das contas nenhuma delas ia me servir. faltava tudo, e tudo não diz nada.

aí teve esse dia em que acordei. tinha perdido peso. não que tivesse emagrecido. mas agora eu levitava. por algum motivo, que nunca mais me preocupei em saber, a lei da gravidade não tinha efeito sobre mim. e era aquela sensação de euforia. não estava bem nem mal, nem normal. era só eu flutuando. não conseguia mais tocar o pé no chão. a vida realmente parecia ter adquirido aquela leveza que tanto me receitavam. mas meus pés permaneciam longe do chão. foi fácil me adaptar. difícil foi as pessoas se adaptarem a mim. mas acho que é assim com todo mundo. mas meus pés não tocavam mais o chão. e não importava mais se ele estava sujo. se as pessoas andavam se empurrando. eu apenas flutuava. e meus pés nunca mais sentiram o chão. e logo tinha gente que não achava a menor graça nisso. talvez porque não acreditassem. isso fugia a todos os seus códigos de crença. talvez fosse um pouco de inveja. porque também tinha aquelas pessoas que também precisavam de ver o mundo com leveza. talvez também quem já olhasse para aquilo como algo prosáico. meus pés não tocavam o chão. e daí? grandes coisas.

o fato é que você cansa de flutuar. afinal, todo mundo sonha alto. tem uns que deixam de sonhar por um motivo ou por outro. eu deixei de sonhar alto porque meus sonhos ficaram lá em baixo quando comecei a flutuar. então decidi ir embora. fui subindo, subindo... em direção aonde eu não sabia ao certo. mas era para longe daquela vida que não poderia mais ter, nem se quisesse (e não era o caso). longe das pessoas que eu amava, é verdade, mas que não era mais compatível quando você flutua. meus pés de fato nunca mais reencontraram o chão. só foi ruim porque naquela semana eu tinha me matriculado nas aulas de sapateado.

segunda-feira, março 21, 2005

sobre o tempo que leva até perceber que o tempo passou

em algum momento na minha adolescência eu assisti Antes do amanhecer e é aquele tipo de filme muito fácil de você se identificar com ele quando é adolescente. acho que muita gente deve ter visto esse filme e ter tido a mesma sensação que eu. pô, eu já fiz planos de passar a noite percorrendo uma cidade estrangeira com uma estranha, uma francesa, ainda por cima. e aquela coisa romântica de fazer o momento valer a pena e deixar que o acaso os una de novo. e tem meio aqueles ecos da famigerada e assustadora geração X, aquela coisa de ficar andando aí pelo mundo sem ter muita certeza do que vai ser o futuro. sei que gostei do filme, lembro de que nele tem duas ou três frases que eu vibrei (embora não lembre exatamente quais são as frases) e apesar disso tudo eu não lembro de tê-lo visto mais de uma vez. vi em vídeo, acho que logo quando foi lançado, mas não sei precisar exatamente quando.

aí fiquei sabendo que o filme ia ter uma seqüência e a princípio achei meio nada a ver, porque lembro justamente que tinha gostado do final meio indefinido do primeiro filme. mas claro que fiquei curioso pra ver o filme e saber como tinha sido a vida desses personagens nos últimos nove anos.

aí eu assisti o filme faz alguns dias. e ele traz uma sensação estranha. primeiro porque você percebe que o tempo passou. o período entre a despedida deles no final do primeiro filme e o reencontro nesse é de nove anos, o mesmo intervalo entre o lançamento dos filmes. então assistir Antes do pôr-do-sol é um exercício estranho porque o tempo para os personagens pode ser o mesmo tempo para o espectador. então, se você viu o primeiro filme faz tempo, você vai perceber que muita coisa aconteceu na sua vida desde então, assim como aconteceram coisas na vida dos personagens. as mesmas pessoas, mas ainda assim diferentes. uma coisa a indicar isso é o fato deles terem se lamentado esses anos todos o fato de não terem trocado telefones, nem endereço. e no primeiro filme eu gostei quando eles tomaram essa atitude, mas aí nesse filme novo eu me vi concordando com os personagens de que aquilo foi um estupidez enorme. claro, a visão de mundo agora é completamente outra. o filme acaba sendo uma experiência diferente, não fica só na sala, não é só o tempo de projeção... tem todo esse intervalo de anos que você acaba se dando conta, assim como os personagens fazem no filme.

e a cena que mais me abalou no filme foi uma imitação de Nina Simone. na época do primeiro filme eu não conhecia bem Nina Simone, mas provavelmente já devia ter ouvido My baby just cares for me. acabei conhecendo e gostando muito dela. teve um ano que eu lamentei não poder ir vê-la se apresentar em São Paulo. e depois ela morreu e eu nunca mais vou poder ver um show dela. aí tem essa cena em que Celine conta que foi a duas apresentações dela, e pergunta a Jesse que diz que nunca teve oportunidade de ir. foi quando veio essa sensação que não sei definir bem o que é, mas é como se o filme tivesse se tornado real. durante esse tempo, em algum lugar entre 1995, ano do primeiro filme, e 2005, quando eu assisti o segundo, eu havia conhecido essa cantora, que veio a falecer em 2003, aí tem esse personagem de ficção que se lamenta de não ter ido a nenhum show dela e tem essa outra personagem de ficção que comenta sobre como ela era ao vivo e começa a imitá-la.
Antes do pôr-do-sol pode ser um filme muito simples em termo técnicos e estético, mas a sensação de realidade e cmplicidade que essa cena me proporcionou foi algo inédito em filmes.

domingo, março 20, 2005

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a sensação que fica quando o momento passou

sábado, março 19, 2005

uma conversa com Maria Flor - parte II

- Oi... desculpa vir tão tarde... eu queria conversar com alguém... aí lembrei de você
- Relaxa. Tava devendo mesmo outra conversa, hein? Por que você demorou tanto?
- Sei lá. Rolou tanta coisa durante esse tempo. Desculpa.
- Você não tem que ficar pedindo desculpa o tempo todo, tem? Vai, relaxa. Quer alguma coisa? Chá? Café?
- Água, pode ser?
- Meio sem graça, mas pode.
- Você falou uma das coisas que eu sempre quis ouvir, sabia?
- O que? Ninguém nunca te oferece chá nem café?
- Não. Você disse ?por que você demorou tanto?. Tudo bem que eu imaginava isso em outro conceito. Mas era essa frase exata.
- Legal. Disponha. Mas vai, fala o que você veio fazer aqui.
- Vim conversar.
- Sobre?
- Sei lá. Precisava conversar. E você tem uma conversa boa.
- Ok. Você tá começando a soar repetitivo. São quase cinco horas da manhã, você veio aqui por alguma razão, pra falar algo. Então, é melhor falar, né?
- Certo. Sei lá... eu tô cansado de me sentir assim... incompleto...
- Por que você se sente incompleto? Me explica. Eu acho que não sei bem o que é isso.
- Eu tava pensando agora, logo antes de tocar sua campainha: lembra do Lego? Às vezes naquelas caixinhas de montar alguma coisa... você montava o carro, a casa, sei lá o quê, aí tinha vez que sobrava alguma peça. E você pensava: por que aquela peça sobrou? Aí ficava a dúvida se tinha montado certo.
- Certo. Aí tinha a peça que sobrava do Lego, mas a coisa já tava lá montada, linda como devia ser. Por que se preocupar com a peça que sobra? Você não está incompleto porque sobrou alguma peça... sobra alguma peça em você?
- Não.... eu sou essa peça que sobra. O mundo está perfeito e eu não me encaixo. É como se eu só existisse pra as pessoas terem dúvidas se o mundo é perfeito.
- Ok. É o seguinte: o mundo não é perfeito... nem você é uma peça de lego. Agora, se entendi bem, você não tem problemas de ser incompleto, mas tem problemas porque vê o mundo completo. Você vê o mundo completo, certo? Agora me diz, por que o mundo é completo? O que te faz pensar assim?
- Sei lá... tudo. As pessoas. Tá todo mundo bem... e eu só apareço pra atrapalhar isso. A sorte é que eu sou um fracasso até para atrapalhar as pessoas. Aí o mundo continua lá, perfeito. Cada coisa no seu lugar ou próximo disso... as peças se encaixam... eu não.
- Tá. Vou te dizer uma coisa... ninguém se encaixa, pô. Eu não me encaixo. E quer saber? Eu não dou a mínima pra isso.
- Claro que se encaixam. Mesmo que tenham problemas... mas até os problemas entre elas se encaixa... você vê a tensão entre as pessoas, mas aquela tensão está dentro do contexto.
- Vai. Para de falar de maneira figurada. Diz direto o que aconteceu contigo hoje. Para disso. Você levou um fora? Ô, você levou um fora! Não foi a primeira vez, certo? Acontece com todo mundo.
- Você não é o tipo de pessoa que se mete nisso... não parece ser.
- Eu sei que você sabe. Eu sei porque você veio falar comigo. Era sobre isso que você quis falar o tempo todo. E não sei porque você não chega logo e fala.
- Tá. Eu fiz algumas merdas por simplesmente chegar e falar logo. E tem até a ver com hoje...
- Ok. Mas eu não sou assim, ok? Sei que você também não gosta de ser assim. Quantas coisas já deixou de dizer por causa dessas convenções, desses tabus? Eu já deixei de dizer um monte, sabia?
- E você agora fala tudo que vem na telha.
- É. Quase sempre. Ok. Você queria saber desde o começo como eu faço isso de não precisar estar junto de ninguém. Eu vou ser sincera, nunca parei para racionalizar bem isso. Mas pensa bem, por que as pessoas têm sempre que encontrar o amor da vida delas e terminarem a história juntos?
- Eu não quero encontrar o amor da minha vida. Não quero mais. Eu já encontrei, sei onde está... mas não quero mais chegar perto.
- Pronto. Nós nos entendemos. Você acha que precisa estar com alguém? Alguém que vai te completar, mesmo que seja a coisa mais sofrida do mundo vocês estarem juntos... Vale a pena passar por isso só para se sentir completo?
- Algumas pessoas acham que sim.
- Exato! Realmente, elas acham. E eu respeito muito isso. Respeito quando um casal consegue dar certo. Quando eles optam em ficar juntos apesar de tudo. É realmente muito bonito e gratificante. Mas é isso que é: uma opção.
- E você optou pelo contrário.
- É. Eu não me sinto incompleta. Eu me sinto bem sozinha. Também sei onde está meu amor. Sei que sou capaz de amar, mas não preciso demonstrar isso. Ele não precisa dessas demonstrações, talvez nem queira. É triste? Paciência. Minha vida vai estar perdida pra sempre por causa disso?
- Ok. Então você é feliz...
- Você acha que merece ser feliz? Você acha mesmo? Pois eu acho que você não agüenta ser feliz. Você morreria de tédio se fosse feliz.... você sempre quer as coisas mais além... só que você não aceita isso... Você quer o impossível? Alguém disse a você que era impossível e você acreditou. Agora vê só onde você já chegou querendo isso... Alguns diriam que já é muito dada as circunstâncias. Você vai dizer que não é nada... Ótimo, eu digo.
- Eu vou ficar eternamente desejando tudo que eu não tenho?
- Eu acho eternamente muito tempo. Mas se você prefere se contentar com o que tem, sai por essa porta e vá ser feliz, porque você já tem tudo que quer. Mas eu sei que você não é assim.
- Então eu devo ficar fazendo essas coisas... e tudo continua dando errado?
- Por que você não fala? Fala o que você fez que foi errado...
- Ah! Não é isso... você nunca faz nada que se arrepende? Não queria ter alguém, uma pessoa específica aqui agora com você?
- Claro. Olha... eu tive uma filha durante esse tempo em que estive fora viajando
- Uma filha? E onde ela está?
- Romênia... o pai ficou com ela. Ele se casou e a menina nem sabe que eu sou a mãe dela.
- Você sente falta?
- Sinto muita falta. Às vezes quero largar tudo e ir atrás dela...
- E por que não fez isso ainda?
- E quem vai cuidar de você?
- Caralho... tá mudando tudo. Eu esperava que você fosse personagem de um conto infantil, não de um melodrama.

terça-feira, março 01, 2005

e com esse são 210 posts, nem são muitos levando-se em conta que lá se vão mais de três anos. claro que esse post não tem a intenção de comemorar o fato de ser o 210º, mas acabou de ter a ver e o resto é só coincidência. mas o fato é que acho muito complicado esse lance de sentar para escrever. dá muito trabalho. sei que deve ter gente aqui e ali que acessa esse blog, com mais ou menos freqüência, e percebe que raramente ele está atualizado. e quando ele foi criado, eu tinha a intenção de escrever bem mais coisas. e muitas delas até começaram a ser escritas, mas, na maioria, o texto não conseguia transmitir o que eu queria dizer. exatamente porque isso de sentar para escrever nem sempre funciona comigo. quando eu tenho o que escrever, o texto sai até rápido. no caso oposto, eu posso passar muito tempo sem conseguir escrever nada, ou escrevo e apago e fico revisando várias vezes. também tinha aquele lance de que eu não queria que o blog se transformasse em uma obrigação. de ter que ficar atualizando só para atualizar. e das vezes que fiz isso foi desastroso. e também pode-se notar que os textos nunca são longos. eu não acho que tenho algo a dizer por mais de alguns parágrafos. e não estou dizendo isso por exagero. claro que eu já escrevi coisas que ultrapassaram as 100 páginas. mas é algo que é totalmente a parte. ou é algo que considero como dever, ou algo que é um forma de praticar. tá. as pessoas que me conhecem sabem que boa parte das atividades que eu me envolvo, tanto por opção quanto para poder me manter, dizem respeito a escrever. no caso do jornalismo, que no momento é essa forma de me sustentar financeiramente, é um texto que sai quase no automático. a maioria das matérias que escrevi eram do tipo fill the gaps e quando não, foram editadas até ficarem tão sem graça quanto as primeiras. no caso da produção acadêmica, eu encaro como um resultado daquilo que venho estudando. não me interessa tanto o que escrevo, mas o que estou estudando. quanto aos roteiros, é algo que realmente eu gosto de fazer, embora não seja nada prazeroso. gosto de bolar as cenas, gosto de ir desvendando os personagens no decorrer da história, quando surge uma fala boa ou uma solução interessante para ligar as cenas (e isso é algo bastante abstrato) é algo que me faz ter certeza que é isso que quero fazer. então é isso. é meio que uma justificativa, mas é mais pra escrever algo sobre como é complicado essa coisa toda de sentar para escrever.