Como eu costumo dormir bem tarde sempre me batia a preocupação de estar incomodando as pessoas por escutar música em um momento em que praticamente não existe mais barulho no resto do mundo. E normalmente nesse horário eu escuto música em um volume mais baixo do que normalmente. Só que tudo parece soar mais alto. A saída seria usar um headphone - que é uma invenção maravilhosa. Só que nunca me passava pela cabeça em comprar um. Simplesmente não estava nas minha prioridades, muito menos em meus caprichos consumistas. Assim, continuava a ouvir música à noite sob a tensão de alguém chegar e pedir para eu abaixar (ainda mais) o volume. Até que um dia, por uma dessas reviravoltas da vida moderna, me vi tendo que trocar uma mercadoria em um lugar onde nada me despertava o interesse. E em um momento mágico eu avisto um headphone, que podia não ser maravilhoso, mas também não era ruim. Então levo pra casa graças à ética dos vendedores e ao código de defesa do consumidor. Passei a usar o meu headphone sem grandes estardalhaços. É só mais um daqueles artefatos que passamos a usar no nosso cotidiano, sem nem nos darmos conta dos benefícios que trazem.
Em um período próximo uns amigos falam entusiasmadamente sobre um cantor cuja música servia de background. E durante as falas deles e o som que embalava a conversa fui me interessando. Chego em casa e vou procurar as músicas para baixar pela internet. Depois de algumas semanas em que o programa não funciona direito, enfim consigo baixar um disco de 36 faixas entitulado The Headphone Masterpiece desse cara chamado Cody Chesnutt.
Sim, como o nome sugere, é um disco para ser ouvido usando o headphone. Não se preocupa em esconder a precariedade com que foi produzido. Nada impede sua apreciação através de qualquer outro equipamento. Pode ser ouvido nas melhores caixas acústicas, em aparelhos hi-fi, o que for. Mas, de fato, é um disco concebido para os fones de ouvido.
Foi em 1992 que Cody Chesnutt desfez um contrato que tinha com uma gravadora, através de sua banda Crosswalk, para se dedicar a fazer música da maneira que achava mais certa. E passou-se uma década até que com o lançamento do já citado disco seus planos começassem a se concretizar. Trancado no seu quarto usou uma estrutura simples para gravar suas composições tocando quase todos os instrumentos. Assim dá pra sacar que o headphone do título não é uma metáfora, foi uma peça fundamental para a produção.
Musicalmente trás alguns elementos que remetem à energia do rock dos anos 60, algo de soul e R&B, e uma presença maciça de hip-hop. As letras são cotidianas girando em torno do universo masculino, podem beirar ao machismo em alguns momentos. A voz de Chesnutt casa bem com a atmosfera que ele cria para suas músicas. Existe uma legitimidade no que ele canta que busca a emoção sem se importar muito com a afinação. Também há uma certa empáfia, presentes desde o nome do disco e do número de músicas (estrear logo com um disco duplo é muita pretensão), mas tudo parece se justificar pela jornada pessoal e quase solitária (mais uma vez os fones de ouvido) que o disco é. O disco não é exatamente a obra-prima que se pretende, a não ser, talvez, para aqueles momentos em que pode ser ouvida através da solidão de um headphone enquanto tenta levar algum projeto pessoal adiante.
terça-feira, maio 24, 2005
meu headphone não salvou minha vida... ... mas é bom tê-lo por perto
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