domingo, abril 13, 2003

...bom. Aí tinha esse cara. Ele estava atravessando uma rua e viu um papel no chão. Ele se abaixou para ver o que tinha escrito. Manda ele olhar para a direita. Quando ele olha vê um carro se aproximando e ouve-se uma pacanda. Corta para ele acordando. Na hora eu pensei: o papel só podia ser uma brincadeira de mal gosto. O papel estava no meio da pista e dizia para olhar na direção em que vinham os carros. Uma mensagem que servia para alertar o que ela mesma provocava. Não estivesse o papel ali, o cara não teria parado no meio da pista.

O que se segue depois é uma avalanche de pensamentos e reflexões sobre a vida e os sonhos. Sobre a humanidade, sobre evolução, sobre relacionamentos, sobre sentimentos, sobre filosofia, sobre ciência... e nada muito lógico. Ou melhor, nada muito bem articulado, como num sonho. É uma sensação parecida com a do papel que Waking Life me dá. Não necessáriamente por ser uma brincadeira de mal gosto. Mas no sentido de querer explicar coisas por ele mesmo despertadas. E não é o caso de ser bom ou ruim por causa disso.

Gosto de ver pessoas conversando. É interessante ver como um assunto vai se desdobrando, como as pessoas vão criando seus argumentos e como isso acaba definindo pontos de vista. Seja lá sobre o que conversam, é dessa forma que pessoas se conhecem. É como elas se constroem socialmente. E cada tópico levantado serve talvez para completar ou complicar mais cada um. Waking Life é só conversas e reflexões. Um filme com muito texto aparentemente é um saco. Porque não escrever um livro sobre isso? Provavelmente porque um livro precisa ser mais centrado, ter uma conexão de ideias. O filme é, talvez, um processo que levaria a um livro. E um filme se constrói em cima de imagens. E ele usa isso bem, fazendo certas simbologias, retirando discursos de um contexto e colocando em outro no meio da conversa.Em um dialogo se discute exatamente a diferença entre cinema e literatura. E Waking Like não é sobre um cara numa realidade estranha é sobre esse cara nessa realidade estranha. E isso faz muita diferença para o filme. Na forma como a mensagem é recebida.

Tem uma cena em que uma mulher esbarra com o cara e volta para ele para explicar como aquilo a incomodava. Porque eles se esbarravam e pediam desculpas e iam embora sem nenhum tipo de interação humana. E ela fala que não queria ser como formigas que se encontram mudam a direção e seguem como se nada tivesse acontecido. Ela faz esse discurso sobre o distanciamento das pessoas e acaba por resolver esse problema. Ao se mostrar insatisfeita e ir explicar isso ao cara o problema entre os dois para de existir.Parece tão óbvio, mas é tão difícil de acontecer.

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