Se você soubesse que aquela pessoa com quem estava conversando sobre os benefícios da capoeira para o físico... Bom, se você soubesse que ela iria morrer poucas horas depois... Se tivesse como saber, o que você faria? Tentaria impedir? Mesmo sabendo que foi um fim trágico? Mesmo que tenha sido algo no qual você tenta encontrar uma tendencia romântica (na acepção mais idealista do termo)? Mesmo que você tivesse acabado de conhecer tal pessoa? Você se acharia capaz de mudar alguma coisa? Anos e anos de sofrimentos deixados de lado por causa de uma conversa de mais ou menos uma hora? O que você pensaria? Pois não a conhecia tão bem assim. Teria o direito de pensar algo? Sei, cinco minutos é o suficiente para mudar as coisas. Até menos, às vezes. Mas nem sempre é possível mudar as coisas. E mesmo que a conhecesse de longa data, talvez você não teria como fazer essa pessoa continuar viva.
sábado, maio 31, 2003
quinta-feira, maio 29, 2003
terça-feira, maio 27, 2003
06h - acordar (ou fingir estar acordando)
07h - ocupado, comendo
08h - ocupado, esperando
09h/12h - ocupado, aula
12h - ocupado, dirigindo-se
13h/17h - ocupado, trabalhando (ou arrumando algo para se ocupar)
18h - ocupado, voltando pra casa
19h - ocupado, tomando banho, comendo e relaxando
20h/21h - ocupado, estudando ou tentando estudar
22h - ocupado, vendo TV ou lendo
23h - ocupado, preocupado com a saída
00h - ocupado, checando e-mails e vendo coisas na internet
02h/06 - ocupado, dormindo
... e, nas horas vagas, a vida.
quarta-feira, maio 21, 2003
Duas garotas, acho que estudantes da Universidade Federal, estavam sentadas naquelas cadeiras que ficam na parte de trás do ônibus (CDU/Várzea). Elas estavam conversando, um pouco alto, mas o necessário para um poder escutar o que a outra falava. Como sempre acontece quando pego esse ônibus, indo da aula para o trabalho na sexta feira, eu estava sonolento e nem dei muita bola para elas nem para o resto da humanidade que também fazia o trajeto.
Em certo ponto, as duas se levantaram e foram pra frente, acredito que iam descer ali perto da Riachuelo. Percebi, então, que uma usava uma saia curta, mas nem tanto, e a outra uma daquelas calças capri, nada demais, e eram bem bonitas as duas. Eu prestei atenção um pouco enquanto as duas se perdiam no meio das outras. Nesse momento escuto o seguinte comentário: "depois dizem que estuprador tem culpa?" Como assim? O que foi que as meninas fizeram de errado? Estavam sentadas na parte de trás do ônibus? Estavam sentadas pertos de homens? Estavam usando roupas que chamam a atenção? Falavam alto? Eram bonitas? Como assim? Não sei se estuprador tem culpa até que ele estupra mesmo. Mas aí já é tarde. Infelizmente sou um sujeito que tento ser diplomático e não gosto muito de violência, além do quê sou fraco. Infelizmente porque minha vontade foi dar um chute na cara dos dois sujeitos com minha bota de fazer trilha.
Um comentário desses me remete diretamente a um clima de filme noir. Todo mundo é culpado. Se algo acontecesse àquelas garotas, o cara que fez o comentário e o outro que concordou com ele seriam os culpados. Não por comenterem o ato em si, mas porque, através de um pensamento como este, eles mostram que seriam capazes de fazer, talvez só não fazem por algum tipo de incapacidade, respeito a regras sociais ou sei lá o que. Mas o que dizer de mim? Eu olhei para as garotas tambem, né? Posso condenar alguém num assunto desses? Vivo tentando evitar ter atitudes machistas, mas isso faz parte da minha formação. Reconheço quando isso vem a tona e tento evitar.
Pois bem, os caras culparam as meninas, eu culpei os caras... certamente sou culpado também. Com certeza uma trama de filme noir, só que com bem menos charme.
segunda-feira, maio 19, 2003
There's such a lot of world to see
- I could never do that!
- S'easy
Crescer dói, né?
Um dia eu vi Bergman dando uma entrevista na TV e que ele falava sobre a vida dele. Teve uma coisa que ele disse que deve ter mudado a minha vida de alguma forma. "Envelhecer é muito difícil e doloroso". "Ninguém nunca me avisou que era tão difícil". Não sei se por ser Bergman ou por ser um senhor de mais de 80 anos... mas o conteúdo disso melancólicamente pertinente na vida de qualquer pessoa. Ontem, voltando de uma 'noitada' às 6h da manhã, eu comentei com um amigo que 24 horas de um dia é quase nada para uma pessoa lidar com todos os seus problemas. Sempre tem algo que vai ficar pra depois. E ainda assim a vida pode ser longa demais...
quinta-feira, maio 15, 2003
Hoje eu decidi escrever um texto normal de blog. É. Algo que as pessoas leiam e compreendam. Que fale bem claramente das minhas experiências e que possa, talvez, faze-las pensarem que conhecem um pouco de mim. Ou, talvez, que elas se divirtam com algum acontecimento inusitado ou uma frase engraçada que eu bole. Nele eu posso comentar o assunto do dia, falar de problemas gerais da nossa sociedade, dar um testemunho desavisado sobre a vida nesse início de século. É mais fácil fazer as pessoas entenderem antes de sentirem, e talvez seja mais justo também. E certamente é menos desconcertante para todos.
A respeito de Os Palhaços de Fellini: um filme sobre a figura mítica do palhaço. É, aquele sujeito que normalmente se apresenta nos circos com a cara pintada e fazendo coisas patéticas. O filme é um documentário... aliás é um filme sobre a produção de um documentário que “resgata” a história do palhaço, enfatizando o processo de desaparecimento ou de perda de significado ou de re-significação desta representação de uma cultura popular muito antiga que foi varando a história e se adaptando às mudanças. A primeira cena do filme é daquelas que despertam uma nostalgia por algo que eu mesmo nunca presenciei. Um garoto é acordado por barulhos que vêm do lado de fora da casa e quando abre a janela vê uma grande lona sendo levantada. Durante a apresentação dos palhaços no circo o garoto chora com medo (eu também tinha esse medo de palhaços) e compara aquelas figuras circenses a outras figuras que encontra comumente pelas ruas. E talvez esses sejam os palhaços mais patéticos e mais assustadores de todos. Com inúmeras cenas de apresentações, belas tomadas do mundo circense, o filme mostra tanto seu lado cômico e quanto seu lado melancólico. Mostra bem como eles deram origem a cômicos da era do cinema e mais tarde da televisão com o humor corporal e as gags. É bem mais interessante do que esse texto; tem um visual belíssimo sem ser muito elaborado e revela uma pesquisa cuidadosa sobre o tema, embora não desvende tudo o que o espectador gostaria de saber, pelo menos no meu caso.
A respeito as adolescentes encontradas mortas no meio do canavial: todo mundo parece ter dado grande importância ao crime. Apareceu em todos os jornais locais, nos grandes sites, telenoticiários locais e nacionais, e foi um assunto corriqueiro no IRC e nos webfóruns. Sim, um crime chocante, sem dúvidas. E quando esse tipo de coisa acontece sempre ressurge uma discussão muito controversa e fragmentada sobre violência. Fala-se de pena de morte, de falta de vontade política para resolver o problema. Põe-se a culpa nas famílias que deixaram as meninas irem pra não sei onde não se sabe com quem, ou a culpa nas meninas por serem inconseqüetes e fúteis. Diz-se que a polícia vai prender logo os envolvidos, diz-se que nunca vão ser encontrados, que vai passar no Linha Direta. Gente que saiu do Brasil por causa da violência acha que tomou a decisão correta, quem ficou os chamam de covardes dizendo que é preciso lutar para que o país melhore. O Brasil não tem mais jeito. O mundo está perdido. É o final dos tempos. Bom, isso tudo deve fazer mesmo sentido, quando tudo no mundo é gerado por violência, desde a natureza até às normas de convívio social e as formas como elas são burladas. Não quero ser pseudo-filosófico nem pseudo-engajado, mas nesse momento está caindo uma chuva a pelo menos uma hora e deve estar dificultando a existência de muitos por aí. Tem uma porra de um vírus se espalhando em vários países e por enquanto nada pode ser feito. O mundo está cheio de conflitos armados em todo canto. O Brasil vive um momento em que todas as diferenças sociais são expostas num problema chamado tráfico de drogas. Andar pela rua é sentir bem todos esses problemas. E mesmo assim é preciso que um crime ‘bárbaro’ aconteça no seio da classe-média para as pessoas ‘esclarecidas’ emitirem suas opiniões cheias de preconceitos. O mundo não é tão simples, e uma simples atitude não vai modificar em nada a realidade. É preciso observa-lo de uma forma mais completa e não só quando entram no nosso jardim. E, ainda assim, ter certeza de que, mesmo que todas as providências possíveis e imaginadas sejam tomadas, pessoas vão continuar a morrer vitimas de violência de todos os tipos, inclusive das geradas por essas providências. Vamos ser culpados sempre.
A respeito de qualquer coisa: é impossível estar dentro de uma sala vazia.
terça-feira, maio 13, 2003
De repente você se depara com esse tipo de coisa: "o que fazer?". O que fazer? Provavelmente é uma decisão muito séria... só que normalmente é tomda de uma forma bem simples, meio que sem traumas aparentes. Isso porque tem que se decidir algo de qualquer forma... a gente meio que se acostuma a isso.
domingo, maio 04, 2003
... em casa, depois do Garagem
"Nem sempre existe coincidência entre ruptura e consciência de ruptura"Sérgio Paulo Rounet
Essa frase para defender que a pós-modernidade é um dos casos em que há a consciência de ruptura mas a ruptura talvez nem exista. Eu particularmente encaro o termo como uma irônia mais do que como a tentativa de afirmar que estamos em uma nova idade histórica. Sendo a favor ou contra o uso do termo pós-modernidade para se referir ao contemporâneo (termo que eu prefiro, embora seja pouco preciso e inúitil históricamente) ninguém pode negar que o projeto da modernidade sofreu nas últimas décadas golpes não previstos que acabaram por inserir mudanças e 'correções' à ilusão de uma sociedade moderna, o 'sonho' racional de uma vida moldada pela ciência e guiada pelo progresso.
Dito isto posso passar adiante. Hoje eu levei um dos melhores foras da minha vida - que não foram poucos. Mais: não sei se ela notou que foi um fora, pois seria preciso estar inserida num contexto bastante particular da minha vida para notar. E o assunto subjacente do que ela me disse tinha a ver com uma ruptura ou com a consciência de ruptura. Ela disse mais ou menos que estava lá para desmentir as coisas que eu tinha imaginado, especificamente sobre a impossibilidade de vir a conhecê-la, e que a razão de estar lá falando com ela era porque minha vida deveria mudar completamente, que eu deveria deixar de lado todas as formas de encarar a vida que eu conhecia e partir pra algo novo. Seguir adiante, talvez. Faz sentido, faz todo sentido do mundo. Foi o jeito dela de dizer: acorda pra vida. "Os sonhos não vão se realizar, ok?" "Eu não sou mais aquela menina que você viu na varanda e pensou que jamais conheceria." "Estou aqui na frente e sou bem real e nada disso é especial". O fato de ela ter me dito algumas coisas não muda nada objetivamente. Mas é bem clara a mensagem de que não adianta tentar realizar os sonhos, esquematizar alguma coisa, planejar... a vida é muito mais expontânea.
Ainda que não haja uma ruptura, é importante por trazer a consciência de ruptura.
Ruptura é uma palavra legal de se falar.
... a dor vem do desejo...
sexta-feira, maio 02, 2003
Problema#1: o tamanho da população é um dos grandes problemas do mundo, apesar de um certo sucesso de políticas de controle de natalidade; outras políticas de diminuição populacional menos ortodoxas se mostraram pouco eficazes, fugiram do controle ou batem de frente com os direitos humanos.
Problema#2: a economia global vem atingindo taxas absurdamente grandes graças aos valores agregados e ao jogo especulativo e negócios futuros, no entanto as riquezas que circulam no planeta ainda estão muito ligadas aos recursos naturais, renováveis ou não, e projeções apontam que até a metade desse século os valores vão ser tão altos que a Terra será pequena para sustenta-los, não havendo recursos capazes de cobrir a economia.
Problema#3: aponta na direção da má distribuição e do desperdício dos recursos o que vai aumentar cada vez mais a diferença entre os que podem dispor de excedentes e daqueles que apenas têm para sobreviver.
Problema#4: todas as projeções apontam para o período entre 2045 e 2060 quando se atingirá a "massa crítica" o que significa pouco tempo para mudar o quadro... tempo que, por sinal, está correndo agora.
Problema#5: quando isso acontecer, será um marco histórico sem precedentes pelo fato de já ter sido previsto ao longo dos dois últimos séculos, o que pode levar a conclusão que certas coisas em história são inevitáveis.
Problema#6: um acontecimento desse muda toda a forma de se estudar e de se enxergar o mundo, pelo menos deveria mudar, no entanto, os pensamentos pouco têm evoluído nesse sentido... vivemos numa época de revisão onde todas as linhas filosóficas são reprocessadas diante de contextos diversos dos quais as originaram e tem dado pouco resultado consistente, ainda que todos sejam interessantes.
Problema#7: o conceito de felicidade passa por uma crise na medida que não pode ser atingida por todos, se é que ainda pode ser atingida... hoje, quando mais pessoas têm algum acesso ao saber e á ciência, esse conceito continua a ser levado em conta da forma como foi encarado em épocas em que poucos tinham acesso a este tipo de informação... um desafio é lidar com a felicidade num mundo prestes a se colapsar.
Problema#8: diante desse quadro o crescimento, desde meados do século passado, no interesse por religiões que pregam o desapego material é uma política interessante para o contexto atual, no entanto o desapego simbólico não é exercido, por razões compreensíveis, e por isso mesmo é a grande barreira para encarar o colapso do mundo tal qual o conhecemos.
Problema#9: todos sabem que essas palavras pouco ou nada podem ajudar e no entanto inúmeras pessoas estão voltadas para este ofício o que dá um certo tom desesperado e desesperançoso a tudo que é lido sobre o futuro.
Problema#10: quem sabe o que pode ser feito não consegue por em prática por causa do distanciamento, quem poderia por em prática não sabe o que fazer... no meio disso tudo, a arte poderia, mas não consegue como incitar as duas vertentes a se aproximarem.
quinta-feira, maio 01, 2003
Problema#1: eu sempre estou esperando algo acontecer
Problema#2: sempre acredito nas coisas que as passoas falam só pra serem legais... um pessoa muito importante pra mim disse que eu não devia levar tão a sério tudo que as pessoas dizem... outra disse que eu não devia levar em conta pessoas que dizem qualquer coisa pra serem legais
Problema#3: sou invejoso, sempre quero ter as experiências que eu não vivi... por conveniência ninguém pode tirar isso das pessoas
Problema#4: sinto em demasia, e nem sempre tanta intensidade é necessária
Problema#5: tento compreender as pessoas, mas nunca vou conseguir entendê-las de verdade porque eu sempre fui eu
Problema#6: amor pra mim sempre teve uma carga de sofrimento, talvez como consequência da minha educação de filhinho cristão exemplar
Problema#7: meu senso de realidade distorcido (resumiria tudo isso, mas é bem sonoro)
Problema#8: sempre me sinto uma fraude quando alguém me elogia
Problema#9: nunca vou poder tocar numa banda de hardcore de mininhas, por motivos óbvios... como também nunca vou poder ser uma diva, nem modelo da Lancôme... e mais, nunca vou tocar numa banda de jazz, nunca vou ser bonito - por mais que meu cabelo esteja legal...
Problema#10: sempre acabo escrevendo mesmo sabendo que não vai ajudar em coisa alguma
"A força avassaladora, totalmente desnorteante, da contradição.Entendo agora que cada fato é anulado pelo fato seguinte, que cada pensamento engendra um pensamento oposto e equivalente. Impossível dizer qualquer coisa sem alguma ressalva: ele era bom, ou ele era mau; ele era isso, ou era aquilo. Todas são verdadeiras. Às vezes tenho a sensação de que estou escrevendo sobre três ou quatro homens diferentes, bem distintos, cada um deles representa um desmentido de todos os outros. Fragmentos. Ou a anedota como forma de conhecimento."
Por que escrever, afinal? Pergunto eu. Era pra ser um conversa... não um show de horrores.