quinta-feira, outubro 03, 2002

Sobre esperar

Ao se aproximar do ponto, eis que avista o ônibus que não vai parar além do lugar indicado. Mesmo que corresse não conseguiria alcança-lo. Resta o consolo de que o próximo vai passar...
À noite, sentado no meio-fio, continua esperando. Dessa vez, não há garantias, tudo se baseia em um aviso, uma espécie de acordo que não tem obrigação de ser cumprido. Diante da situação, enfim percebe o perigo que estar sentado tão próximo a pista. Em meio ao vácuo deixado pelos carros em alta velocidade, a certeza de estar se arriscando por algo sem indicativos de concretização. Mas continua lá, vendo a vida passar em flashes de luz e barulho dos motores. Continua correndo o risco, na espera de algo que não sabe bem o que é. Tivesse certo de algo, não estaria mais ali. Tudo continua insistentemente seguindo adiante, teimando em não parar. A realidade intrínseca da espera consiste no paradoxo de parar, enquanto tudo é movimento. Sem movimento não haveria a espera. A partir daí o mundo ganha um brilho húmido e o desespero e a sensação de impotência diante do todo-movimento cresce surda entre a eloquente falta de conteúdo do discurso alheio, de máquinas, seres e ambientes. Sentado à beira do caminho, queixo sobre um volume de capa vermelha repousdo nos braços apoiados em cima dos joelhos curvados, um som eletrônico avisa a aproximação. O mundo não parece ter mais sentido, apesar disto. O carro para próximo ao meio-fio. Abre a porta e entra sentando-se no banco de trás. E o carro vai embora...

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